Patricia Courtois cozinha e viaja; cozinha e ri; cozinha e emociona. Há vários anos vem atravessando rios e salinas, subindo trilhas de montanhas, se conectando com as pessoas e a natureza de distintas geografias. Nos trajetos que percorre, coleta sabedorias e compartilha histórias de vida que enriquecem a sua bem nutrida biblioteca de sabores.
Nos últimos anos, o seu receitário teceu redes com o mundo do vinho: restaurantes de vinícolas de diferentes terroirs da Argentina levam seu selo único e, assim, com assessorias feitas sob medida para cada estabelecimento, ela se transformou em um nome de referência da culinária relacionada ao vinho argentino.
Atualmente Patricia Courtois é a chef executiva da 5 Suelos Cocina de Finca, o restaurante da Durigutti Family Winemakers, que fica em Las Compuertas, Mendoza. E há várias vindimas, também vem prestando assessoria para a Bodega Colomé, em Salta, para todas as suas atividades de gastronomia e turismo. Além disso, em paralelo, trabalha na identidade do novo restaurante da Vinícola Amalaya, localizado também em terras saltenhas.
Seus perfis nas redes sociais a mostram cozinhando em feiras como a Bocas Abiertas e a Master of Food & Wine, em Mendoza, ou formando parte de uma experiência de luxo no Pristine Luxury Camps, um hotel único localizado na região de Salinas Grandes, em Jujuy. Também exibe registros do seu trabalho na Hostería Rincón del Socorro, em Esteros del Iberá, na província de Corrientes, onde trabalhou junto de outras mulheres cozinheiras locais para criar propostas com produtos genuínos e receitas ancestrais, um projeto integral que a levou a vencer o Prix de Cuisine da Baron B, em 2018.
Conversamos com a Patricia Courtois sobre a relação entre a cozinha, o vinho e as alegrias que a boa mesa desperta.
Entrevista com Patricia Courtois
Como é o seu trabalho gastronômico em relação ao vinho?
Em geral, as e os fazedores de vinho são sonhadores e põem grande parcela de sua personalidade e de sua história em cada garrafa. Eu me coloco a serviço das e dos produtores e tento expressar em meus pratos a história que cada vinho tem para contar.
Como é esse processo de interpretação?
É muito interessante compreender o que acontece em cada uma das vinícolas. Trata-se de conectar com o terroir, essa palavra que tanto escutamos. Os vinhos são a expressão do terroir, e a minha culinária também. É o vinho, são as equipes de agronomia, de enologia e todas as pessoas que cuidam das plantas durante o ano todo, a vindima, as paisagens, as flores, os animais, a horta, os produtos genuínos. Tudo influi na personalidade dos vinhos. Eu me esforço para refletir Isso em meus menus. Inclusive, eu não falo de pratos, gosto de pensar mais em uma ideia geral, um conceito que surge a partir de muitas conversas com as e os protagonistas de cada vinícola.
Como é o 5 Suelos Cocina de Finca, o restaurante da Durigutti Family Winemakers?
É um lugar com uma personalidade muito familiar, aquela energia convocante da mesa dominical junto ao vinho caseiro, da celebração que significa se reunir com as pessoas mais queridas para beber e comer. Os pratos são festivos, alegres, não servimos em travessas, apesar de que evoquem essas travessas de avós que refletem a alegria do encontro. Trata-se de respeitar e honrar a história do vinho.
Logo o restaurante vai lançar uma nova experiência que foi um desafio e uma grande aprendizagem para mim: vamos apresentar um menu de passos em sintonia com a história dos vinhos e da vinícola.
É um trabalho maravilhoso que estamos fazendo em parceria com o sommelier Martín Krawxcyk Pardo. Ele tem uma enorme capacidade para colaborar com seu conhecimento na cozinha e me permitiu quebrar meus preconceitos sobre os menus de passos. Muitas vezes me parecem longos ou sem sentido. No entanto, eu aprendi ser possível oferecê-los com uma nova perspectiva, de um ângulo novo, muito lúdico. Esperamos que logo possam desfrutá-to.
Patricia Courtois, como é a sua interação com a área de enologia e de agronomia das vinícolas?
No caso da Colomé, o aprendizado foi muito intenso, porque em cada lugar para onde vou, faço um trabalho de imersão no território. Isso exige tempo, porque para criar a carta de um restaurante de vinícola, é preciso viver a experiência no lugar pelo menos durante as quatro estações, por isso considero ser tão importante ver os vinhedos no inverno, a horta na primavera, ver como é a vindima.
Agora que os dias mais quentes estão prestes a chegar (eu estou atualmente em Cafayate), tudo explode de alegria, é um estado de ânimo que fica impregnado em todo o trabalho e tudo isso se vê na carta. A Colomé tem a particularidade de que tudo está ao alcance da mão, tudo o que se usa está aqui, é tudo muito genuíno.
O resgate de saberes ancestrais e o protagonismo das cozinheiras de cada território é um pilar da sua filosofia de trabalho…
É, esse foi em parte o trabalho que se iniciou em Esteros del Iberá com as cozinheiras correntinas e aonde eu vou, tento ativar essa energia, essa conexão com as mulheres, a terra e a cozinha.
Não tem nada melhor que acompanhar um vinho com os produtos de cada lugar. A emoção que se sente, por exemplo, ao cozinhar a “humita” – uma receita patrimonial – em março, com o milho recém colhido, é uma festa. Nas minhas viagens eu aprendo que, em todos os lugares, existe o trabalho das mulheres por trás dos vinhos, dos produtos, das cozinhas. Ele deve ser visibilizado, por isso eu gosto de montar equipes com mulheres, considero que somos fazedoras e temos a possibilidade de transmitir conhecimentos através de gerações; algo fundamental para não perder esses saberes, essas receitas.
Você está trabalhando em duas das regiões vitivinícolas mais importantes do país, Salta e Mendoza. Você nota que a gastronomia está crescendo?
Observo que existem cada vez mais vinícolas que apostam na gastronomia como parte de sua oferta turística e isso é muito importante. Tem propostas para todos os gostos e para as e os chefs, é sempre um desafio nos destacar entre tantas boas opções.
Sempre digo que para mim hoje a inovação é voltar às origens. Eu aprendo muito do mundo do vinho, é incrível, ele permite uma conexão com todos os nossos sentidos. Eu me interesso por tudo o que ocorre com produtores de vinho em lugares e condições extremas. Gosto de colaborar com esses projetos que são um pouco difíceis em matéria de geografia e clima, porque acredito que com perseverança se conquistam muitas coisas e o vinho sempre demonstra que é possível obter beleza a partir de lugares completamente inesperados.