Brancos e tintos que saem do comum sacodem o tédio da indústria e despertam novos consumidores, que buscam surpresa e inovação. Valeria Gamper, Melhor Sommelier da Argentina, compartilha seus favoritos entre os vinhos mais curiosos da Argentina.
O gosto está na diversidade e evidentemente a Argentina é ampla em termos de vinhos. Graças a produtores dinâmicos e inovadores que agregam valor a cepas não tradicionais ou recuperam técnicas antigas, hoje o panorama é mais variado que nunca.
Brancos nada convencionais
Até pouco tempo, referir-se aos brancos argentinos podia parecer estranho. No entanto, o país deu várias mostras do seu potencial para vinhos com Chardonnay, Sauvignon Blanc e White Blends. Hoje, com muitos de seus vinhos instalados como joias entre os brancos do mundo, ainda conta com etiquetas que poucos adivinhariam que são elaboradas na Argentina.
Entre as mais originais está a Norton Special Edition Grüner Veltliner. Sim, a variedade emblemática da Áustria produzida em Mendoza graças à sua introdução no país pela família Halstrick-Swarovsky, atuais donos desta bodega centenária. Apesar do Norton ser o primeiro e, no momento, único produtor desta cepa na Argentina, elabora uma versão tranquila e outra espumante enquanto amplia seus hectares de Grüner Veltliner no Valle de Uco e na Patagônia.
A Alvarinho é uma das poucas brancas espanholas que ganhou fama global. Para além da Galícia, considerada sua terra natal, ou do norte de Portugal, foi cultivada com sucesso no Uruguai, nos Estados Unidos e até em Bordeaux. Na Argentina, há escassos oito hectares e algumas bodegas a elaboram com sucesso. A Viña Las Perdices foi a precursora e desde 2011 produz com uvas de Agrelo, em Mendoza, a 980 metros sobre o nível do mar.
A Costa & Pampa, por sua vez, é uma bodega experimental de Trapiche localizada a 6 km do mar em Chapadmalal, Buenos Aires, onde consegue um expoente de acidez distintiva, álcool moderado e uma marcada influência oceânica. Combinada com Riesling e Savagnin, também é encontrada no Tiara, um blend incomum, mas muito elegante da Viña Alicia.
Um pouco mais difundida, a Gewürztraminer oferece bons resultados em zonas altas e frias de Mendoza, ainda que também na Patagônia, em San Juan e em Buenos Aires. Os pioneiros em trabalhá-la de maneira varietal foram Rutini e Luigi Bosca. A primeira bodega desenvolveu o primeiro varietal seco em 1994 e a segunda, como vinho doce, sob o nome Luigi Bosca Selección de Granos Nobles.
Bienconvino Aperitivos y Postres Gewürztraminer é o primeiro branco off-dry do mercado e faz parte de uma linha elaborada pelas sommeliers Valeria Mortara e Mariana Achával, pensada para harmonizar com pratos.
Ainda que seja a variedade com mais amplitude da Argentina, apesar de não ser a Pedro Ximénez da Espanha, foi usada tradicionalmente para misturar e dar volume a vinhos genéricos de consumo diário. É considerada como da família das “criollas” e poucas vezes foi vista vinificada como varietal. Mariana Onofri defende a cepa elaborando o vinho branco tranquilo Alma Gemela Pedro Ximénez, proveniente de parreirais velhos de sua propriedade em Lavalle.
Tintos curiosos
A Bequignol é uma variedade do sudoeste francês que atualmente tem mais extensão na Mendoza que em sua terra natal e uma uva protagônica entre os vinhos mais curiosos da Argentina. Surpreende saber que o país conta com mais de 500 hectares e que só um vinho tem seu nome na etiqueta.
Germán Masera foi quem a colocou em pauta e a transformou em objeto de desejo de todo sommelier. Com uma enologia de baixa intervenção, o engarrafa sob a marca Livverá. É um vinho leve e fresco proveniente de parreirais de Zampal, na cidade de Tupungato, na província argentina de Mendoza.
La Garnacha é uma cepa mediterrânea, resistente à seca e a climas extremos, com tendência a maturar tardiamente. Por tudo isto não surpreende que tenha se adaptado a zonas quentes da Argentina como os Valles Calchaquíes ou algumas regiões de Mendoza.
O primeiro varietal saltenho de Garnacha foi Estancia Los Cardones Tigerstone, proveniente de uma vinha pedregosa de Tolombón, e é fluido e refrescante. Os expoentes mendocinos que se destacam são Ver Sacrum Garnacha e o rosado estilo provençal Padma de Corazón del Sol.
Outra forasteira é a Cordisco, de origem italiana, mais precisamente de Abruzzo, onde geralmente é conhecida como Montepulciano. Os irmãos Durigutti a plantaram em 2012 em Luján de Cuyo e em 2017 lançaram um varietal que mantém todo amante de vinho em alerta. Elaborada em ovos de concreto com leveduras nativas, sai na linha Proyecto Las Compuertas.
Vinos de flor e montanha
Apesar das fortes raízes da cultura espanhola, na Argentina os vinhos com maturação biológica são tão raros como escassos. Entre os poucos produzidos se destacam Pedrito Vino de Flor da Finca Las Moras, elaborado em San Juan com uvas Pedro Ximénez.
Ao mesmo tempo, em Mendoza existem dois expoentes de culto entre os amantes deste estilo de vinhos. Volare de Flor de Bodega Per Se é uma mescla de safras de Chardonnay, enquanto o Altar Uco Edad Antigua Vino en Flor de Juan Pablo Michelini é um Sauvignon Blanc de Gualtallary, do Valle de Uco.
Como resultado da inovação e da curiosidade dos seus winemakers, hoje os vinhos argentinos brilham em categorias em que, anos atrás, poucos poderiam imaginar, e viraram um novo favorito dos amantes de vinhos exóticos e originais.
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